sábado, 27 de dezembro de 2008

354 A Súmula que Coíbe Invasão de Terras




Súmula 354: "A invasão do imóvel é causa de suspensão do processo expropriatório para fins de reforma agrária."

Podemos dizer, trocado em miúdo, que as súmulas publicadas pelos tribunais são, na verdade, a cristalização da jurisprudência. Mas o que é a jurisprudência se não a interpretação que dão os tribunais, através dos guardiões da Justiça, do direito e da lei vigentes, por certa época em determinado estado. Mas há diferença entre Direito e Lei, de tal forma que isso deve ficar bem claro.
O Direito é uma construção ética, histórica, sedimentada ao longo dos anos e experimentada na vida social, de forma a dar segurança às pessoas, nas suas relações com os demais e também, com os órgãos dirigentes do próprio estado, a que se submete. É o exemplo da aplicação do direito que faz com que o cidadão possa planejar e atuar socialmente, certo de que suas ações serão respeitadas e o resultado pretendido será alcançado, pois a ordem social o assegura. O Direito é, assim, uma garantia de que a conduta honesta alcança os resultados previsíveis e, desta forma, alimenta a esperança das pessoas na vida pública, econômica e particular. A lei deve ser conforme o direito, mas é legitimamente editada pelo estado, regulamentando circunstâncias que, às vezes, dependem do arbítrio do governante. Exemplo disso é como o Direito ao definir que somente as pessoas com total discernimento e liberdade de pensar são livres para manifestarem validamente sua vontade, de forma que essa possa, por exemplo, ter validade num contrato. Essa capacidade se alcança com o pleno desenvolvimento mental. Mas para que os contratantes não tenham dúvida quanto à existência desse pleno vigor mental, convencionou-se que aos dezoito anos completos, alcança-se a plena capacidade civil. A lei é, assim, uma regra convencionada pelo estado, para comandar e regulamentar a vida social.
No entanto, diante das variadíssimas circunstâncias da vida social, a lei, muitas vezes, deve ser interpretada. “In claris cessat interpretatio”, é como diziam os romanos, admitindo, contrario sensu, que os fatos individualmente examinados podem obscurecer o enunciado da lei e exigir, assim, a sua interpretação. A interpretação da lei, em face da concretude dos acontecimentos é o que se passou a chamar de jurisprudência dos tribunais.
Entre nós, por iniciativa de alguns ministros eméritos, entre eles Victor Nunes Leal, surgiram as súmulas de jurisprudência, que são verbetes, expressões, anunciados gerais que unificam as interpretações, em virtude das reiteradas decisões dos Tribunais. Os primeiros verbetes foram aprovados em sessão plenária do Egrégio STF, em 13 de dezembro de 1963, entrando em vigor a partir de 1º de março de 1964.
Nem precisava entrar em vigor mais tarde, pois não sendo, como de fato não é, fonte formal de direito, mas mera interpretação, não obriga o julgador, mas dá-lhe o norte a seguir. O fato é que logo a Justiça do Trabalho (enunciados) e outros Tribunais começaram a sumular os entendimentos e, destarte, auxiliar a interpretação das questões de direito, acaso de mais de um raciocínio completo. A instituição das súmulas, assim, transformou-se em excelente auxiliar para a agilização da justiça.
Decorrentes dos vários incidentes de Uniformização de Jurisprudência requeridos pelos advogados, ou editadas nos termos do Regimento Interno de cada Tribunal (art. 96, I, a, da Constituição da República), as súmulas obrigam diretamente só os órgãos julgadores do mesmo Tribunal, não os demais órgãos judiciais, mesmo que vinculados ao tribunal que as emitiu. Daí o feliz conceito emitido por Cândido Rangel Dinamarco, que afirmou serem as súmulas, para o juiz, mais do que um simples conselho, mas menos do que uma ordem.
Apesar disso, a melhor definição de Direito Sumular é, ainda, a do Ministro Pedro Acióli, do Egrégio STJ, no Recurso Especial 3.317-BA, publicado em 26/11/90:
"DIREITO SUMULAR. CONCEITO. O direito sumular traduz o resumo da jurisprudência sedimentada em incontáveis e uniformes decisões das Cortes Superiores do país, que visam a rapidificação de causas no Judiciário. A se dar seguimento ao inconformismo das partes, manifestado em peça recursal, em total colidência com texto de Súmula do Tribunal, estar-se-ia a instaurar um regime anárquico, que afronta o princípio de uniformização das decisões. Prevalência do entendimento contido no direito sumulado, que traduz a manifestação de um colegiado, para negar provimento ao agravo regimental" (Superior Tribunal de Justiça, 1ª Turma, unânime, relator o Ministro Pedro Acióli, Ag. Reg. em R.esp. nº 3.317-BA, pub. em 26.11.90, ADV Jurisprudência 52.533).

As súmulas, assim entendidas, mesmo não sendo fonte de direito, nem por isso deixam de ter força interpretativa vigorosa, pois consolidam a integração da lei aos casos concretos. São uma orientação para o Tribunal que a edita, bem como para as demais instâncias. O entendimento sumulado é uma orientação da instância superior, que anima ou desencoraja a contenda.
Desse estudo resulta a importância que se dá à recentemente editada Súmula 354, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Súmula 354: "A invasão do imóvel é causa de suspensão do processo expropriatório para fins de reforma agrária." (Referências: RESP 819.426/GO, RESP 893.871/MG, RESP 938.895/PA, RESP 590.297/MT e RESP 964.120/DF) SÚMULA (fonte: http://www.stj.jus.br)

Fundamentou-se esta no entendimento de que, nos casos de invasão da propriedade rural, há prejuízo na averiguação da produtividade do imóvel, de forma a identificar a área como passível de ser desapropriada. Concluiu-se, diante disso, que eventuais invasões, mesmo denominadas como sendo conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo podem alterar o resultado das demandas dessa natureza, inclusive após concluída a vistoria administrativa, trazendo prejuízo ao direito da parte expropriada, ao prejudicar a prova de que sua propriedade pode ser produtiva e livre de desapropriação para fins de reforma agrária, nos termos do artigo 185, II, da Constituição Federal.
O entendimento firmado pelo STJ se coaduna perfeitamente com a posição adotada também pelo STF. Em consonância com a nossa Suprema Corte, ao cuidar do tema a Lei nº. 8.629/93, alterada pela MP nº. 2.183/01, percebe-se que se desenvolve e evidencia a vontade do legislador em impedir a proliferação de invasões em propriedade alheia.

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