quarta-feira, 7 de novembro de 2007

A transposição e a Revitalização do Rio São Francisco.


Segunda-feira 11 de junho de 2007- Estado de MinasO ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, anunciou na tarde desta segunda-feira, durante entrevista coletiva no Salão de Convenções do Hotel Ouro Minas, em Belo Horizonte, ações a serem desenvolvidas pelo Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do São Francisco. Serão realizadas obras de esgotamento sanitário, replantio de matas ciliares e proteção às margens do Rio em diversas localidades do estado.As regiões mineiras focalizadas são as que permeiam os municípios de São Roque de Minas, Bambuí, Lagoa da Prata, Pirapora e Montes Claros, com investimentos totais de R$ 311,2 milhões. Os recursos serão distribuídos da seguinte forma: São Roque de Minas, R$ 9,7 milhões; Bambuí, R$ 40 milhões; Lagoa da Prata, R$ 102 milhões; Pirapora, R$ 70 milhões; Montes Claros, R$ 88 milhões. O ministro participou de reunião com o governador Aécio Neves, nesta segunda, no Palácio da Liberdade. Na ocasião, o chefe do Executivo mineiro requisitou mais recursos para a revitalização do Rio São Francisco, em algumas regiões do estado. “É preciso que os recursos para a revitalização do Rio, em suas várias etapas, seja nas estações de tratamento de esgoto, seja na recuperação de suas matas ciliares, enfim, em vários outros projetos, possa ocorrer o mais rapidamente possível”, afirmou.Geddel Vieira Lima, por sua vez, admitiu que os recursos são insuficientes para cobrir toda a extensão do Rio. “Recursos são sempre insuficientes. Os estados brasileiros, e Minas não é diferente, sempre precisarão de mais recursos, de mais investimentos em função das grandes demandas que têm. Mas eu já assumi com o governador o claro compromisso de apresentar aquilo que nós imaginamos que pode ser feito aqui”, enfatizou. Analisando a notícia.A crítica mais acerba que se faz à transposição do São Francisco diz respeito à existência de uma equivocada relação de custo-benefício. Mas todos são favoráveis à revitalização do Rio. Se a transposição abre discussões ideológicas e expõe manifestações político partidárias precipitando debates eleitorais, a revitalização é unanimidade. É necessário examinar a questão à luz da notícia veiculada no Estado de Minas de ontem.A transposição do Velho Chico, para o Governo Federal, é um projeto arrojado, mas necessário. Vários segmentos sociais e econômicos têm tomado posições, muitas delas antagônicas. Alguns militantes políticos insistem que é uma teimosia faraônica do Presidente. Outros, por outro lado, entendem que é uma determinação profética, a ser reconhecida pela posteridade como conduta corajosa. Certo é que empreendimento desse vulto não pode prescindir da razoabilidade jurídica, racionalidade administrativa e respeito a políticas públicas de meio ambiente. O interesse social não se encontra dissociado dos interesses econômicos. É de um primarismo setecentista a alegação de que as águas transpostas serão usadas para alimentar o agronegócio, em nada beneficiando a população pobre. Essa alegação primária parte do princípio de que a agricultura em grande escala seja inimiga do cidadão comum, algo que beneficiaria somente o empresário do campo. Esse pensamento é regresso aos debates dos tempos do início da revolução industrial, dividindo a população entre a burguesia, detentora dos meios de produção e o populacho, ou proletariado, que lhe era hostil. Malgrado isso, a revolução industrial triunfou. Daqui a pouco será absolutamente impensável alimentar as populações do globo sem a produção agro industrial em grande proporção. Não há oposição ou diversidade entre progresso econômico das áreas beneficiadas e progresso social. Resta saber se haverá prejuízo ambiental de tal monta que desaconselhe a proposta, ou custo tão exorbitante que não beneficie a população na mesma escala, em futuro próximo. Razoável também é fiscalizar o custo e a lisura das concorrências. Vigiar para que não ocorra, como no passado, a inversão dos interesses das populações pelo interesse de políticos que, historicamente, sempre manipularam e viveram de verbas de combate à seca, que não alcançavam o sertanejo. Mas, certo é que a discussão em torno do tema permitiu a ampliação do debate sobre a revitalização do Rio. É sabido que a sua situação atual é de lamentável indigência. O assoreamento constante, ao longo de anos e anos, bem como o desleixo ou desmazelo das autoridades politicamente responsáveis que sempre encolheram os ombros para a deterioração da qualidade de suas águas, alcançam impacto enorme na atualidade. A cultura do ribeirinho que sempre pensou que a natureza fosse mais forte e exuberante do que a capacidade deletéria do homem está chegando ao fim. Falo aqui de pessoas de certo nível de instrução e conhecimento, pessoas que influem na vida social nas cidades da bacia do São Francisco. O homem do campo e os pescadores têm consciência dessa deterioração gradual do meio ambiente e, nos últimos tempos, se constituem nos seus primeiros defensores. Na minha terra, margem do Lambari, “que corre para o Rio Pará, que vai bater no São Francisco”, na minha infância havia mais de trinta conhecidas nascentes d’água na periferia da cidade. Hoje, me narra amigo meu daqueles tempos, que não haveria mais de três ou quatro, “assim mesmo, no tempo das águas”. Não bastasse a diminuição das fontes e do fluxo das águas a cultura de má formação ambiental, que não é privilégio dos ribeirinhos, permitiu que se desenvolvessem constantes agressões ambientais praticadas pela própria população urbana, como a de contaminação da água pelos esgotos domésticos e industriais, a degradação ribeirinha constante através do mau aproveitamento do solo, tanto na agricultura quanto nas pastagens, provocando deterioração das águas e assoreamento do Rio. A notícia estampada traduz vontade política de mudar a imagem e o destino do Rio. Certo que nem só de dinheiro depende a revitalização, mas principalmente da mudança dos ideais políticos imediatistas para projetos de longo prazo, projetos que não visem o eleitor das próximas eleições, mas as gerações futuras. É, no entanto, muito animador pensar que os Municípios de São Roque de Minas, Bambuí e Lagoa da Prata se encontram entre as primeiras cidades a serem contempladas. São municípios das nascentes do Rio da Unidade Nacional. Pirapora e Montes Claros são cidades de porte médio para grande. Os esgotos industriais dessas duas cidades são, ao pé da letra, verdadeiros canais de poluição do Rio. O rio Verde Grande que absorve os esgotos sanitários e industriais de Montes Claros deteriora toda uma região, desde que, nascendo em Bocaiúva, passa por lá.e por extensa área regional do Norte de Minas, alcançando o Velho Chico já na Bahia.O que se percebe é que os Municípios deverão integrar o trabalho, em conjunto e parceria com órgãos federais e estaduais. Nesse trabalho há que haver, principalmente, vontade de agir no campo e distanciamento de academicismos. No plano de recuperação de áreas degradadas e revitalização de fontes e de rios, já temos trabalhos acadêmicos bastante. É tão vasta a literatura, tantas teses, tantas monografias, que já disputam em agressividade e condenação a pecuaristas, agricultores e mineradores, atribuindo-lhes, quase sempre, culpa de ações e condutas criminosas. “In medio virtus”, como dizia Paulo, o apóstolo dos gentio, nem são sempre culpados, nem tão inocentes como pensam que são. Culpados somos todos nós que não agimos no campo e ficamos apenas nos estudos e proposições acadêmicas, muitas delas distantes da vida das pessoas. Culpados somos todos nós que permitimos que se esgotassem as “minas dágua” da minha infância em Araújos, como em outros muitos municípios do Alto São Francisco. Certo é que, em conjunto, de forma racional para não prejudicar a economia, o bem estar e a sobrevivência da população, é preciso planejar uma gestão integrada dos recursos naturais da bacia do Alto e Médio São Francisco. Essa gestão pode ser em cooperação, sobretudo com relação a recursos hídricos, através de ações intermunicipais em virtude de micro-bacias, sem descurar os interessados no investimento, capacitação técnica e qualificação de pessoal, bem como de incentivo a cursos técnicos e universitários, de forma a aprimorar os recursos humanos.Há que ser incentivada a regeneração das matas e vegetação de margens do Rio e de seus afluentes, sem impor sobrecarga ao proprietário ribeirinho, uma vez que a maior parcela da devastação ocorreu no passado, iniciativa de donos anteriores e quando a lei não impunha sanção à conduta do desmatador e havia a cultura de que esses recursos da flora e da fauna seriam inesgotáveis. Esse incentivo deve vir através de insumos, projetos, apoio técnico, sementes, mudas e recursos de financiamento. Isto pode ser traduzido na recomposição das matas ciliares, mas também em reflorestamentos. As matas ciliares auxiliam na manutenção da qualidade da água e na estabilização do solo. Evitam erosão e o assoreamento. O reflorestamento pode ser feito com vegetação nativa, permitindo a criação de pólos de sementes e de mudas. Mas, comporta estimular, também, o reflorestamento com espécies alienígenas. A indústria madeireira bem planejada, além de lucrativa é fator de preservação das matas nativas. Isto sem falar que pode ser financiada através de projetos de seqüestro de carbono. E tudo isso é motivo de aumento do emprego e fator de estabilização do homem no campo.A notícia dá duas notas auspiciosas. A primeira é de que os municípios foram lembrados e chamados a participar. A segunda é de que os recursos serão disponibilizados para o trabalho de campo. Agora resta uma advertência: - Há muita coisa que se faz sem recursos. No entanto, com eles se faz melhor. Mas não bastam. É preciso que haja vontade, disposição e gente preocupada na sua gestão. Mãos à obra!
*Vitório de Campos é Jornalista e Consultor do IDAA.

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